segunda-feira, 2 de junho de 2014

Pronto, tá pago!


Depois de 152 dias, ou 5 meses, eu já trabalhei o suficiente para pagar os impostos que devia à nação. Até seria justo se houvesse contrapartida, mas não vou entrar nesse mérito especificamente.
O problema é que, como não há saúde pública, terei que trabalhar mais 1 mês para pagar pelo plano de saúde. Isso porque ainda sou relativamente jovem, senão gastaria ainda mais tempo para pagar pelo plano, afinal sabemos que à medida que ganhamos idade o valor do plano aumenta, e a cobertura diminui.
Lá se foram 6 meses.
Só que, como não há segurança pública, terei que trabalhar mais 1 mês para pagar os seguros do carro e da casa.
Lá se foram 7 meses.
Falando em casa, serão necessários mais 3 meses completos para garantir minha moradia pelo ano todo.
Lá se foram 10 meses.
Eu preciso me manter vivo, limpo e vestido, então somados os gastos com alimentação, limpeza, higiene pessoal, vestuário e eventuais gastos com medicamentos, descontados os impostos que já paguei, lá se vão mais uns 3 meses.
Lá se foram 13 meses.
Opa! Mas isso é o ano inteiro de trabalho mais o meu 13º! E eu ainda não gastei um centavo com o meu lazer.
Bom, nesse ponto já percebemos que falta mês nesse ano para pagar por tanta coisa, então eu vou ter que escolher se abro mão do plano de saúde e encaro as intermináveis filas e o atendimento precarizado da rede pública de saúde, ou se abro mão dos seguros do carro e da casa ou, quem sabe, até mesmo abra mão de ter um carro e volte a recorrer ao transporte público, precário, inseguro e que hoje vive à mercê de vagabundos politiqueiros.
Enfim, para sustentar um modo de vida sem luxo e sem qualquer lazer, de forma minimamente digna, um brasileiro comum gastaria, na melhor das hipóteses, o ano todo de trabalho, isso se não tiver filho, porque aí meu amigo, ou você enfia essa criança numa escola pública (boa sorte!), ou então vende a casa e vai morar sob um viaduto se quiser tentar a sorte numa escola particular. Agora, repare que eu falei "filho". Se esta pequena palavra for flexionada no plural...
Esta continha perversa, que serviu de base para esta dramatização, foi feita com base numa renda familiar total entre 4 e 5 salários mínimos, ou seja, segundo parâmetros governamentais, ocorre de ser uma família de classe média.

Rubens Carvalho Júnior